16/05/2016

Avião

Penso nos aviões que apanhas sem mim e no teu medo de voar.
Olho o céu e cada novo rasgo de fumo me lembra as tuas mãos geladas a levantarem voo, por lugares longínquos do mundo, enquanto eu insisto em subir a encosta da nossa velha montanha de terra. 
A cada passo, eu rezo para que me ouças suspensa em bicos de pés sobre os rochedos do caminho: não voes mais sem mim.
Continuo a escutar em toda a parte o machado entre as tuas mãos cortando a lenha para o lume do serão. As tuas mãos agarrando o volante do automóvel por todos os caminhos de cabras do lugar. Ouço-te, por fim, a mergulhá-las no rio, levando todo o corpo com elas até ao fundo do rio, caindo dentro de uma felicidade de menino simples e muito grato. Corpo todo molhado rindo ao sol, é assim que te lembro a cruzar o céu.
Hoje eu tenho a resposta para o poeta e para nós também: amor que serena não termina.
Não existe um minuto de silêncio na encosta de pedra. Toda ela foi tomada pelo fantasma de um aeroporto medonho repleto de aviões onde entras sem mim e não queres aterrar.
Pela noite dentro, penso nos teus voos e no medo de voar. Logo depois, sonho com as tuas mãos acesas abertas na minha direcção: vamos caminhando até ao cimo da montanha, meu amor?